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POV: você deixou de ser fubanga

e a ciência do glow-up

Avatar de Lyara Vidal
Lyara Vidal
ago 12, 2024
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Oi! Esta edição discute temas como padrões de beleza, transtornos de autoimagem, racismo
e procedimentos estéticos e pode ser uma leitura incômoda pra algumas pessoas.

Deu muito trabalho e foi emocionalmente difícil de escrever, então a íntegra vai ficar disponível pra todos os inscritos por 1 dia. Depois disso, só se tornando assinante pago. Se você acha que minha escrita é legal, que meu conteúdo é importante e que meu cabelo é lindo, pode se tornar um assinante pago clicando aqui.
Foto da atriz Heather Matarazzo em 1995, na pré-adolescência, quando interpretou Dawn em "Welcome to The Dollhouse". Dawn é uma garota de pele branca, cabelos castanhos e óculos de aro grosso. Ela veste uma blusa cropped com babados e botões, calça cigarrette e uma mecha de cabelo no topo da sua cabeça tá presa numa xuxinha. Está séria e de batom vermelho.
Heather Matarazzo em “Welcome to The Dollhouse” (1995), de Todd Solondz, um filme sobre a grande desgraça que é ser uma adolescente esquisita.

Meus vizinhos de internet devem ter notado uma nova movimentação nas placas tectônicas do feed.

A mecânica é simples: o ~internauta~ mostra, ao som de Forever Young, do Alphaville, seu processo de transformação física ao longo dos anos, ou, nas palavras do viral, os “traços de adolescente” indo embora. É fofo. Meus favoritos são aqueles em que dá pra perceber as pessoas mais felizes: uma transição de gênero, a vida financeira melhorando, um casal que envelhece junto.

Alguns posts me dão uma tristeza esquisita. Adolescentes de cabelo colorido agora são adultas de blazer, braços cruzados, cores sóbrias e calça de alfaiataria bege, adeptas do estilo tão característico de coaches e consultoras de estilo do Instagram. Como chamar essa estética? Scam siren? Hotmart Chic? Deolane-core?

Outra trend, que sempre volta com pequenas alterações, compartilha resultados de cirurgias plásticas e jornadas de embelezamento. As fotos de lipos, rinoplastias e preenchimentos acompanham a legenda: “POV (do inglês “point of view”, ponto de vista): você deixou de ser fubanga”. Meninas narram os sacrifícios em nome da beleza e os comentários são unânimes: Evolução! Parece muito mais jovem agora! Glow-up!

Isso me despertou duas dúvidas: 1) por que diabos alguém publicaria uma foto de adolescência de livre e espontânea vontade, e 2) o que exatamente é um glow-up?

arrume-se comigo

Imagem de Anne Hathaway em cena de "O Diário da Princesa". De cabelos alisados, castanhos, e maquiagem feita, Anne é vista, belíssima e com um grande sorriso entre duas fotos do seu antes, com cabelos cacheados, óculos de armação grossa e uma expressão desconfortável.
Cena de “O Diário da Princesa” (2002), adaptação dos livros de Meg Cabot dirigida por Garry Marshall para a Disney.

A gente adora uma história de superação, e a dicotomia entre beleza e feiura tem um papel especial no nosso imaginário. São inúmeras versões do mesmo conto: a gata borralheira, o pato que vira um cisne... Os conflitos magicamente se resolvem e os créditos sobem com uma lição de moral nas entrelinhas: a beleza tem alguma coisa a ver com ser livre. Agora que você é bonita, as coisas vão dar certo.

Lembro de sempre assistir ao Dia de Princesa com a minha avó. Todo domingo, uma mulher da periferia enviava uma carta contando uma história: maternidade solo, dinheiro curto, solidão… A vida era dura, não dava pra se cuidar. Daí, de surpresa, o Netinho de Paula aparecia de smoking dentro de uma limousine e levava essa mulher pra um dia especial, com salão, banho de loja e muitos mimos. Com a transformação, o espectador descobria que aquelas mulheres sempre foram lindas, era só a vida que era dura. Minha avó sempre chorava no final.

Dá pra dizer que passei por alguns glow-ups físicos e mentais. O maior deles veio no primeiro ano da faculdade, quando parei de alisar o cabelo. Mas em geral, fui uma jovem fraca de corpo e mente e torrei todo o dinheiro dos meus estágios e mesada em roupa e balada. Sim, eu tinha um coração puro e muito colágeno, mas era uma jumenta. Paciência.

Não sinto a menor falta dos meus traços de adolescência porque vivi intensamente a experiência de fazer humanas numa federal, e já era uma jovem adulta quando a pandemia chegou. Hoje, na véspera dos 30 — uma das idades mais chiques que uma mulher pode ter — fico satisfeita com parecer ter a idade que tenho. Tô indo bem nisso de ser adulta, mas tenho um pouco de medo de envelhecer errado.

Esse medo não é só meu. A Geração Z caminha cada vez mais rápido rumo a uma epidemia de envelhecimento antinatural. Lembra das Sephora Kids? No começo do ano, funcionários da rede de cosméticos começaram a notar a constante presença de crianças nas lojas.

Nas redes, atendentes relataram a presença de meninas, a maioria de classe média alta e com idades entre 8 e 12 anos, bagunçando lojas, furtando produtos e fazendo birra pelas maquiagens e dermocosméticos queridinhos das influencers, com ingredientes desnecessários e perigosos pra peles tão jovens. As compras chegavam à casa dos milhares de dólares. Em maio, a “cara de travesseiro” da Kylie Jenner, causada por anos de procedimentos estéticos, veio à tona. E em julho, participantes de 22 anos do reality britânico “Love Island” viralizaram pelo excesso de botox.

Meninas são meninas por menos tempo, e o efeito envelhecedor da exposição prolongada à internet assusta: garotas de 12 anos parecem ter 16; garotas de 16 parecem ter 20 e garotas de 20 parecem o Stênio Garcia. É como se a vida passasse mais rápido, e não dá pra ficar parada na entressafra do tempo. Há cada vez menos tempo pra viver os períodos esquisitos da vida antes de virar uma pessoa de verdade.

E aparentemente, se tornar alguém de verdade inclui ter um glow-up.

Cena da série pen15, com Maya e Anna, duas atrizes adultas vestidas de suas personagens adolescentes na frente do espelho. Maya, à esquerda, é uma garota asiática de cabelos pretos e curtos. Usa gloss, lápis de olho e uma camisa xadrez; Anna, à direita, é loira, tem cabelos lisos na chapinha e passa uma camada grossa de lápis de olho, como se fazia na época. As duas vestem roupas dos anos 2000.
Maya Erskine e Anna Konkle vivendo os terrores da pré-adolescência dos anos 2000 na ótima série “pen15” (Hulu)

Pra tentar entender o que exatamente é um glow-up e como passar por ele, passei duas semanas acompanhando duas comunidades femininas focadas no processo.

Sem mais delongas, vamos ao que aprendi.

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