Oi! Esta edição discute temas como padrões de beleza, transtornos de autoimagem, racismo
e procedimentos estéticos e pode ser uma leitura incômoda pra algumas pessoas.
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Meus vizinhos de internet devem ter notado uma nova movimentação nas placas tectônicas do feed.
A mecânica é simples: o ~internauta~ mostra, ao som de Forever Young, do Alphaville, seu processo de transformação física ao longo dos anos, ou, nas palavras do viral, os “traços de adolescente” indo embora. É fofo. Meus favoritos são aqueles em que dá pra perceber as pessoas mais felizes: uma transição de gênero, a vida financeira melhorando, um casal que envelhece junto.
Alguns posts me dão uma tristeza esquisita. Adolescentes de cabelo colorido agora são adultas de blazer, braços cruzados, cores sóbrias e calça de alfaiataria bege, adeptas do estilo tão característico de coaches e consultoras de estilo do Instagram. Como chamar essa estética? Scam siren? Hotmart Chic? Deolane-core?
Outra trend, que sempre volta com pequenas alterações, compartilha resultados de cirurgias plásticas e jornadas de embelezamento. As fotos de lipos, rinoplastias e preenchimentos acompanham a legenda: “POV (do inglês “point of view”, ponto de vista): você deixou de ser fubanga”. Meninas narram os sacrifícios em nome da beleza e os comentários são unânimes: Evolução! Parece muito mais jovem agora! Glow-up!
Isso me despertou duas dúvidas: 1) por que diabos alguém publicaria uma foto de adolescência de livre e espontânea vontade, e 2) o que exatamente é um glow-up?
arrume-se comigo
A gente adora uma história de superação, e a dicotomia entre beleza e feiura tem um papel especial no nosso imaginário. São inúmeras versões do mesmo conto: a gata borralheira, o pato que vira um cisne... Os conflitos magicamente se resolvem e os créditos sobem com uma lição de moral nas entrelinhas: a beleza tem alguma coisa a ver com ser livre. Agora que você é bonita, as coisas vão dar certo.
Lembro de sempre assistir ao Dia de Princesa com a minha avó. Todo domingo, uma mulher da periferia enviava uma carta contando uma história: maternidade solo, dinheiro curto, solidão… A vida era dura, não dava pra se cuidar. Daí, de surpresa, o Netinho de Paula aparecia de smoking dentro de uma limousine e levava essa mulher pra um dia especial, com salão, banho de loja e muitos mimos. Com a transformação, o espectador descobria que aquelas mulheres sempre foram lindas, era só a vida que era dura. Minha avó sempre chorava no final.
Dá pra dizer que passei por alguns glow-ups físicos e mentais. O maior deles veio no primeiro ano da faculdade, quando parei de alisar o cabelo. Mas em geral, fui uma jovem fraca de corpo e mente e torrei todo o dinheiro dos meus estágios e mesada em roupa e balada. Sim, eu tinha um coração puro e muito colágeno, mas era uma jumenta. Paciência.
Não sinto a menor falta dos meus traços de adolescência porque vivi intensamente a experiência de fazer humanas numa federal, e já era uma jovem adulta quando a pandemia chegou. Hoje, na véspera dos 30 — uma das idades mais chiques que uma mulher pode ter — fico satisfeita com parecer ter a idade que tenho. Tô indo bem nisso de ser adulta, mas tenho um pouco de medo de envelhecer errado.
Esse medo não é só meu. A Geração Z caminha cada vez mais rápido rumo a uma epidemia de envelhecimento antinatural. Lembra das Sephora Kids? No começo do ano, funcionários da rede de cosméticos começaram a notar a constante presença de crianças nas lojas.
Nas redes, atendentes relataram a presença de meninas, a maioria de classe média alta e com idades entre 8 e 12 anos, bagunçando lojas, furtando produtos e fazendo birra pelas maquiagens e dermocosméticos queridinhos das influencers, com ingredientes desnecessários e perigosos pra peles tão jovens. As compras chegavam à casa dos milhares de dólares. Em maio, a “cara de travesseiro” da Kylie Jenner, causada por anos de procedimentos estéticos, veio à tona. E em julho, participantes de 22 anos do reality britânico “Love Island” viralizaram pelo excesso de botox.
Meninas são meninas por menos tempo, e o efeito envelhecedor da exposição prolongada à internet assusta: garotas de 12 anos parecem ter 16; garotas de 16 parecem ter 20 e garotas de 20 parecem o Stênio Garcia. É como se a vida passasse mais rápido, e não dá pra ficar parada na entressafra do tempo. Há cada vez menos tempo pra viver os períodos esquisitos da vida antes de virar uma pessoa de verdade.
E aparentemente, se tornar alguém de verdade inclui ter um glow-up.
Pra tentar entender o que exatamente é um glow-up e como passar por ele, passei duas semanas acompanhando duas comunidades femininas focadas no processo.
Sem mais delongas, vamos ao que aprendi.